Qual o status internacional do Brasil? A posição relativa dos países é importante para compreender a distribuição de recursos internacionais. Quanto maior a importância do país para os seus pares, principalmente as potências, mais provável é a obtenção de distintos benefícios. Na última década, a percepção é de declínio da posição relativa do Brasil no mundo. A ascensão internacional brasileira, iniciada nos anos 2000, mostrou-se um voo de galinha. Muita expectativa e pouca altura por pouco tempo. Neste contexto, a machucada Amazônia pode ser o trunfo do País para aumentar o seu status internacional, faltando apenas um detalhe: convencer o mundo disso.
É comum nas relações internacionais descrever três tipos de poder: militar, econômico e político. No militar, o Brasil não assusta ninguém, o que é bom, não desejo de forma alguma um projeto militarista no País. Pelo contrário, hoje gastamos muito com forças armadas, basicamente salários e pensões, e estamos distantes de possuir relevância na segurança internacional. Por isso, a busca por um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU é um erro de autoavaliação. A recente recusa do atual governo Lula em enviar tropas ao Haiti é evidência da baixa capacidade brasileira de contribuir consistentemente com a paz mundial. Em 2004, quando o Brasil liderou, com o aval dos EUA, a missão de paz no Haiti, acreditava-se em um papel mais ambicioso no mundo. Treze anos e três bilhões de reais depois, a missão no Haiti pode ser considerada um fracasso. O Haiti não está melhor hoje, as tropas brasileiras sofreram duras acusações de violação de direitos humanos e, como se não bastasse, a operação de paz promoveu militares hoje investigados pela Polícia Federal por tentativa de golpe de Estado.
Na arena econômica, o Brasil possui hoje o nono maior PIB do mundo, sendo um mercado considerável. Contudo, o tamanho da economia brasileira não é proporcional à sua importância no comércio internacional. O Brasil em 2023 foi responsável por cerca de 1,3% das exportações mundiais, enquanto o México, com um PIB menor do que o brasileiro, 2,32% (segundo o Banco Mundial). Outro fator relevante são as constantes crises econômicas e déficits fiscais que comprometem a capacidade orçamentária de Brasília ofertar benefícios a longo prazo. Apenas como referência, a agência turca de cooperação internacional (TIKA) gastou em 2023, segundo a OCDE, US$ 8 bilhões. O Brasil, segundo o Ipea, em 2021, gastou cerca de US$ 1,5 bilhão de dólares com a cooperação internacional, explicitando a diferença na capacidade dos dois países. Na dimensão política do poder, o Brasil é um líder sem seguidores. Não temos o apoio de vizinhos nas principais postulações internacionais, assim como há uma evidente dificuldade de acessar e mediar as principais mesas de negociações internacionais.
Uma quarta opção de inserção internacional, fundamentada na construção de uma imagem de potência ambiental, emerge como estratégia atraente para a política externa brasileira. Se não temos armas, dólares ou seguidores, ainda nos resta um pouco de floresta tropical. A crescente relevância das temáticas ambientais na arena internacional pode possibilitar a instrumentalização da Amazônia como fonte de poder. A lógica central seria trocar preservação ambiental por recursos. Mas quem no mundo está disposto a pagar? A China certamente não. Não há no discurso da diplomacia chinesa menções à Amazônia ou qualquer intenção de financiar a sua preservação. Está nos EUA e em alguns países europeus, cujos movimentos e partidos verdes geram votos, a expectativa de obter recursos. O Fundo Amazônia, gerido pelo BNDES com doações norueguesas e alemãs, é um exemplo. Convencer a comunidade internacional de que o verde é poder e que o Brasil pode sustentar esse poder é uma possibilidade de elevação do status internacional do País.
Caso a diplomacia seja bem-sucedida em executar essa árdua tarefa, além de dólares e euros, o Brasil pode enfim ter a sua cadeira permanente no mundo.
Pedro Feliú é professor do Instituto de Relações Internacionais da USP
Reprodução Jornal da USP